Um homem é aquilo que é, mais aquilo que faz e aquilo que lhe acontece. Um homem é quem é, mais o seu bom nome, a sua honra, os princípios que traiu ou não traiu. E vive com isso e é julgado por isso pelos outros. Mas nem tudo o que nos acontece, nem todo o julgamento dos outros, depende das nossas acções ou da nossa vontade.
Miguel Sousa Tavares
I. Mais uma vez, David Fincher fez um grande filme. "A Rede Social" é uma espécie de thriller mental. A violência não aparece na forma de "aliens" ou numa caixa com a cabeça de Gwyneth Paltrow . Aqui, a violência surge apenas nas formas que ambição toma quando não tem um freio ético. E, apesar de este ser um jogo puramente mental (ao contrário de outros ), Fincher consegue manter o ritmo narrativo impressionante, apoiado num trabalho notável da montagem. Não é de estranhar: Fincher é perfeito na formação dos ambientes, que, depois, são habitados e percorridos pelas personsagens. Ambientes claustrofóbicos, para sermos exactos. Não estamos, obviamente, na cidade sem nome de Seven, mas The Social Network também é uma fonte de intensa claustrofobia narrativa. Até porque Fincher não está muito interessado em descrever "social" e "realisticamente" Harvard e Boston. Este não é um filme sobre Harvard. É um filme sobre a claustrofobia da ambição pelo poder.
II. Mais: eu diria que este filme não é sobre o Facebook. Ou melhor, Aaron Sorkin (o argumentista) e David Fincher quiseram mostrar uma coisa: os meus amigos podem andar o tempo que quiserem no mundinho virtual, mas, no final do dia, o que interessa é aquilo que fazem no bom e velho mundo "analógico". A cena final é elucidativa a este respeito. A fuga da realidade (seja ela profissional ou sentimental) através da internet não consegue durar 24 horas por dia. Num dado momento, as pessoas têm de voltar à realidade, essa coisa áspera e que "aleija muito", para citar a minha querida avó. Por isso, parece-me que Leo Robson (TLS, 5 de Novembro) não apanhou bem o filme. "A Rede Social" não é a confirmação do legado de Sean Parker ("we lived in the country, we lived in the city, now we shall live on the internet"). Pelo contrário, "A Rede Social" diz-nos que continuamos e continuaremos a viver no mundo "analógico". O mundo virtual é uma ferramenta da realidade, não é uma realidade paralela.
Sem comentários:
Enviar um comentário