sexta-feira, 17 de abril de 2009

17 de Abril de 1969 - início do fim do Regime

No dia 17 de Abril de 1969, em Coimbra, o Edifício das Matemáticas ia ser inaugurado. Esta cerimónia contava com as presenças do Presidente da República (Almirante Américo Tomás), o Ministro da Educação Nacional (Prof. José Hermano Saraiva) e os Ministros das Obras Públicas. Foram recebidos na Reitoria, e seguiram pela Rua Larga até ao Largo D. Dinis. Neste local, os estudantes mostraram as suas palavras de ordem, tais como “Ensino para todos”, “Estudantes no Governo da Universidade” e “Exigimos Diálogo”.

Durante a bênção do edifício, esta feita pelo Bispo de Coimbra com a leitura de um texto, os estudantes voltaram a deixar vincado o seu desagrado interrompendo-o constantemente com gargalhadas e ataques de tosse propositados.

Antes da cerimónia, foi dito ao Presidente da Direcção-Geral da Associação Académica de Coimbra (DG-AAC), Alberto Martins (actualmente, Líder Parlamentar do Partido Socialista), que não poderia intervir na cerimónia, pois o Reitor representava a Universidade e já iria discursar, e a intenção dos estudantes falarem prejudicaria as prescrições protocolares.

No interior do edifício, Alberto Martins levantou-se e interrompeu Américo Tomás pedindo-lhe que lhe fosse permitido o uso da palavra: “Sua Ex.ª, Senhor Presidente da República, dá-me licença que use da palavra nesta cerimónia em nome dos estudantes da Universidade de Coimbra?” A palavra foi-lhe negada com a seguinte saída de Américo Tomás: “Agora fala o Ministro das Obras Públicas”. Após este discurso, também não foi dada a palavra a Alberto Martins, sendo a cerimónia terminada abruptamente. Os governantes foram enxovalhados com gritos dos estudantes de faixas erguidas.
Devido a esse pedido de palavra, Alberto Martins foi detido pela PIDE à porta da AAC e os estudantes mobilizaram-se em solidariedade. Foi, de facto, uma enorme demonstração de união dos estudantes perante a censura e opressão do Regime. Os estudantes eram considerados “desalinhados do Regime” e eram, por isso, perseguidos, sendo Coimbra cercada pela Polícia.

Perante este clima, a Academia decidiu reunir-se em Assembleia Magna, no ginásio da AAC. A adesão dos estudantes foi enorme e até estiveram presentes professores, que punham em causa a sua carreira (Orlando de Carvalho e Paulo Quintela). Ficou decretado o luto académico com greve às aulas.

Numa comunicação televisiva, no dia 30 de Abril, José Hermano Saraiva acusou os estudantes de desrespeito e insultos ao Chefe de Estado. Para além disto, referiu que a ordem seria restabelecida em Coimbra.
No dia seguinte, 4000 estudantes estiveram na Assembleia Magna, a qual se realizou no Pátio das Gerais. Repudiaram-se as afirmações do Ministro da Educação Nacional e ficou demonstrada mais uma vez, a vontade em ter uma Universidade nova.
No seguimento da sua comunicação, José Hermano Saraiva ordenou o encerramento antecipado da Universidade de Coimbra até ao início dos exames. Sendo assim, ficou cancelada a Queima da Fitas desse ano, justificada pela solidariedade para com a Academia e dirigentes associativos que tinham sido suspensos.

No dia 28 de Maio, registou-se a maior Assembleia Magna da história da Academia, com 6000 estudantes. Decretou-se a abstenção aos exames, e foram deliberadas duas “Operações”: “Operação Flor” e “Operação Balão”, as quais consistiam na distribuição de flores e balões que representavam o protesto perante as suspensões e processos de inquérito e a exigência da não marcação de faltas durante o luto académico.
Chegamos ao dia 2 de Junho, dia este que correspondia ao início da época de exames. Coimbra estava sitiada, com GNR, PSP e Polícia de choque a ocuparem a Universidade.

20 dias depois realizou-se a final da Taça de Portugal entre a Académica e o Benfica. O jogo não foi transmitido pela RTP, nem contou com a presença do Presidente da República. Isto, porque o jogo se transformou numa manifestação contra o regime, com cerca de 35000 comunicados a mostrar as razões da luta estudantil.

No mês de Julho, o Governo reage novamente alterando a Lei de Adiamento da Incorporação Militar. O objectivo era fazer depender da prorrogativa “o bom comportamento escolar” do estudante. Desta forma, 50 estudantes foram chamados ao Serviço Militar.
A crise académica de Coimbra conduziu inevitavelmente a uma remodelação política no Sector Educacional do Governo: Veiga Simão assume o cargo de Ministro da Educação Nacional, e Gouveia Monteiro é o escolhido para o lugar de Reitor.

Nesta sequência de acontecimentos, a Academia disse não ao regime e à sociedade injusta que existia. Há quem diga que começou naquele dia, o fim do regime. Pelo menos, abriu-se o caminho às reformas e democratização das estruturas universitárias que, 5 anos mais tarde, o 25 de Abril de 1974 viria consagrar.
O dia 17 de Abril de 1969 fez História, contribuindo verdadeiramente para mostrar à sociedade que era mesmo imperativo instalar a Liberdade e a Democracia no nosso País.



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